O início lento da vacinação contra a COVID-19 e a falta de uma resposta centralizada e coordenada frente à forte escalada do número de casos da doença causaram muitas mortes no Brasil em 2021.

Em 2021, o contexto da pandemia se deteriorou ainda mais em comparação ao ano anterior. A partir do início de janeiro, um aumento acentuado no número de casos no estado do Amazonas levou a um pico da demanda por oxigênio. Não havia suprimento local suficiente para cobrir todas as necessidades, e muitas instalações de saúde rapidamente consumiram seus estoques. Como resultado, dezenas de pacientes que necessitavam oxigênio não tiveram acesso ao insumo e morreram sufocados.

O sistema de saúde da capital, Manaus, entrou em colapso. Como a cidade era a única região do estado com leitos de tratamento intensivo (UTI) para pacientes em estado grave, pacientes de áreas rurais também ficaram sem assistência.

Pacientes que estavam sendo assistidos por equipes de Médicos Sem Fronteiras (MSF) em outras regiões do estado sentiram imediatamente os impactos dos problemas na capital. Como não havia leitos disponíveis em Manaus, alguns de nossos pacientes em estado crítico não puderam ser transferidos de um hospital de Tefé, área remota onde trabalhamos por diversos meses durante a segunda onda da pandemia, e, consequentemente, morreram. Apesar da escassa disponibilidade de recursos humanos e dos desafios logísticos, nossas equipes deram o máximo de si para aumentar a capacidade local de atendimento a um número crescente de pacientes e ajudaram a administrar o suprimento muito limitado de oxigênio disponível na instalação de saúde.

Com o desenrolar da catástrofe em Manaus, enviamos equipes para oferecer apoio e treinamento às instalações de saúde que, originalmente, estavam prestando cuidados básicos, e passaram a enfrentar dificuldades relacionadas com a carência de recursos humanos e de materiais. Essas instalações estavam sendo convertidas, do dia para a noite, em unidades de terapia intensiva (UTI), na tentativa de suprir a demanda explosiva por atendimento médico de mais alta complexidade. Profissionais de saúde mental de MSF também foram enviados a campo para dar assistência ao pessoal de saúde local sobrecarregado física e mentalmente, lidando todos os dias com grandes perdas.

Os problemas foram agravados pela falta de coordenação das autoridades federais. Isso também teve impactos negativos sobre a vacinação, que começou de maneira lenta, em janeiro, depois de as autoridades federais terem questionado inicialmente a efetividade e a segurança das vacinas e demorado a adquirir doses. Adicionalmente, algumas autoridades promoveram o uso de medicamentos sem eficácia e até mesmo desprezaram a adoção de medidas de prevenção, como o uso de máscaras e o distanciamento físico. Alguns dos pacientes que tratamos tinham a ilusão de estar “protegidos” por esses medicamentos e se expuseram à contaminação, exacerbando a disseminação da doença.

Como resultado, ao final de 2021, o Brasil atingiu a marca alarmante de 620 mil mortes por COVID-19, muitas das quais poderiam ter sido evitadas. O país é um dos poucos no mundo com um sistema universal de saúde pública, o SUS, com um histórico de bom desempenho em crises sanitárias anteriores.

No decorrer de um ano repleto de dificuldades, tentamos combater a desinformação com equipes de promotores de saúde em contato direto com nossos pacientes e por meio do uso de nossos canais em redes sociais como forma de contraposição à propagação de notícias falsas entre o público geral.

Demos prioridade às ações de promoção de saúde, adequando nossa comunicação a comunidades vulneráveis. Sempre que possível, contratamos pessoas das próprias comunidades onde trabalhamos e, quando necessário, transmitimos as mensagens em línguas indígenas.

Como forma de responder a uma maior demanda por cuidados médicos em localidades com sistema de saúde fragilizado, ampliamos nossas ações em estados como Rondônia e Pará, na região Norte, e em partes da região Nordeste, como áreas urbanas do estado do Ceará e comunidades remotas da Paraíba e da Bahia. Nosso objetivo foi tentar diagnosticar a doença no estágio inicial, diminuindo a chance de os pacientes precisarem de um leito de UTI, que provavelmente não estaria disponível.

Muitos de nossos projetos também estiveram dedicados à oferta de treinamento a profissionais de saúde, compartilhando nossa experiência adquirida em epidemias anteriores, especialmente no que diz respeito às medidas de controle e prevenção de infecções. Nosso objetivo principal foi preparar equipes locais da melhor maneira possível para que pudessem continuar dando assistência as suas comunidades uma vez que não estivéssemos mais presentes.

No final do ano, nossos profissionais haviam atuado em oito estados brasileiros. A escala de nossa atuação contra a COVID-19 no Brasil foi absolutamente sem precedentes, tanto em volume de recursos humanos quanto de materiais, em nossos 30 anos de história no país.

 

Assistência a migrantes e a comunidades vulneráveis

Nos últimos meses de 2021, com o avanço da vacinação resultando na redução do número de casos e mortes por COVID-19, parte das restrições de movimento nas fronteiras brasileiras foi flexibilizada. Pessoas antes impedidas de buscar melhores condições de vida do lado brasileiro da fronteira finalmente conseguiram cruzar a divisa no estado brasileiro de Roraima onde, desde 2018, MSF tem dado suporte ao sistema de saúde local na assistência a migrantes provenientes da Venezuela.

Com o aumento do número de migrantes chegando à cidade fronteiriça de Pacaraima, ampliamos nossa oferta de serviços no local, assistindo, principalmente, a população em situação de rua por meio de clínicas móveis e ações de promoção de saúde em locais frequentados pelos migrantes. Também mantivemos nosso trabalho na capital do estado, Boa Vista, onde atuamos em unidades básicas de saúde e em abrigos formais e informais. Nesses locais, oferecemos serviços médicos e de saúde mental e testagem para pessoas com suspeita de COVID-19. Equipes móveis também ofereceram serviços básicos de saúde em diversos municípios do estado. Ao final de 2021, expandimos essas atividades para atender comunidades indígenas na região de Pacaraima.

 

Dados referentes a 2021

5.070

Consultas ambulatoriais de COVID-19

590

Pacientes internados por COVID-19

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